quarta-feira, novembro 16, 2022

Dez passos para os sonhos de quem ousa agir.

 



O Livro "Dez passos para alcançar os seus sonhos" de Adriana Maria Queiroz, que trás o relato autobiográfico da filha de um casal de sertanejos baianos, nascida no interior de São Paulo, na cidade de Tupã. Jovem de origem pobre, que trabalhou como faxineira para poder pagar a faculdade, e após luta árdua e incansável chegou à Magistratura por Concurso público no Tribunal de Justiça de Goiás.
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De certo ponto de vista, o livro todo é em si, um depoimento de fé. Como se diz nas igrejas e nos tribunais : um testemunho sólido. Para mim, que não sou um religioso muito convicto (estou mais para um cético, que ainda deposita alguma fé nos limites da ciência moderna), o livro trás alguns ruídos que dificultam minha identificação com a heroína. Não é exatamente um discurso que me representa. Mas, não precisa me representar para ser bom e importante.

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Não é sobre mim, mas pode ser para mim. Porque é um discurso forte, impressionante que representa milhares, talvez milhões de mulheres negras, pobres e persistentes, que constituem de uma maneira inseparável o tecido social que liga toda a nossa sociedade. É um discurso que representa muitas mulheres que atravessam as nossas vidas todos os dias. Como sua mãe, sua irmã, sua amiga, a telefonista do seu emprego, a sua supervisora, a sua assistente ou a colega de equipe. A cliente pra quem você tentou vender um cartão de crédito ou um carro... ou mesmo a juíza que vai julgar o seu caso... 
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O livro da Juíza Adriana, na opinião deste leitor, pode ser visto como um testemunho religioso. Mas, também pode funcionar como uma mensagem saída do rapper mais combativo. É um livro com tom de auto-ajuda, mas também é uma carta honesta, do tipo  "Sobrevivendo no inferno" de Racionais MC. Um auto elogio fundamentado na realidade de vencedora, no estilo Emicida cantando "Toma!" ou "Zica"... Um discurso preparado para a batalha do tipo "Levanta e Anda!"...
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Eu não poderia deixar de observar outro aspecto do livro que abre uma lacuna entre esse testemunho e minhas crenças ou minhas opções discursivas... Em nenhum momento, ou melhor, em raríssimos momentos, como se não precisasse dizer o óbvio, o texto faz referência à negritude da autobiografada; o racismo é colocado como uma das muitas barreiras sociais e materiais que a heroína deve atravessar. O machismo também não é nomeado. Nem mesmo para negá-los ou localizá-lo como evento isolado...
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Eu posso sentir falta desses conceitos, Mas, certamente posso supor que uma mulher, filha de nordestinos, pobre e negra no Brasil, sabe muito bem quem é e de onde veio. E o que o texto da Juíza Adriana Queiroz parece querer enfatizar é: para onde podemos ir e como devemos agir para chegar lá. É antes de tudo um apelo para que a pessoa procure agir. Agir por palavras e pensamentos. 
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Essa suposição se mostra uma convicção tranquila, quando cinco anos depois de publicado o Livro, ela atua como Coordenadora do Comitê de Igualdade Racial do Tribunal de Justiça, procurando monitorar e propor Políticas de eliminação do racismo institucional e de promoção de equidade racial. Agindo como uma das responsáveis pela implementação de cotas raciais nos concursos de servidores e magistrados.
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Ao escutar, no livro, o depoimento coerente da autora, posso não me identificar com todas as suas verdades, mas inspirado pelo seu testemunho honesto e pelo seu exemplo de vida, posso dizer que ela está coberta de razão. De razão e de ação. 
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QUEIROZ, Adriana M. (2017). Dez passos para alcançar seus sonhos. Barueri: Novo Século. 


terça-feira, novembro 15, 2022

Pega a bandeira! Pega a Bandeira!! É tudo nosso!




Quando criança eu não era do tipo atlético. Além disso, futebol não era o meu jogo favorito... Queimado e vôlei, eu gostava, Mas também não achava o mais divertido. O jogo que eu gostava de jogar mesmo. O jogo em que eu me divertia de maneira absurda, era o barra-bandeira. Que alguns chamam por aí de pique-bandeira...   rouba-bandeira, ou mesmo captura a bandeirinha...
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Esse jogo, pra quem não sabe (tanta coisa que alguém pode não saber no mundo das criptomoedas, multi-plataformas e metaversos, que não me espanta que uma massa ignorante ignore essa brincadeira.) é um jogo de poucas regras: dois times, em disputa em um campo com dois territórios contíguos e bem demarcados. No extremo oposto de cada território uma bandeira representando o time adversário. O objetivo do jogo: capturar a bandeira que o outro time tenta proteger a todo custo. O maior desafio, atravessar o território inimigo sem se deixar capturar pelo toque paralisante dos concorrentes... As investidas e contenções de um e de outro lado, são o que marcam a dinâmica do jogo. Durante a disputa, os integrantes do mesmo time podem libertar os colegas que foram imobilizados durante seus avanços.
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Só de lembrar esses movimentos você, que já jogou esse jogo, deve estar sentindo uma pontinha de excitação... pode ser que esteja ensaiando dribles mentalmente aí mesmo na cadeira. Pode ser que esteja rindo por dentro lembrando a esquiva esperta que lhe permitiu chegar até o ponto neutro próximo a bandeira, e quase não se segura pela ansiedade em voltar ao território da companheirada de time com a bandeira capturada em suas mãos... gritos! Risos! sei como é...
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Quando uma pessoa do mesmo time alcança o objetivo. E entra desembestado no próprio território, livre e agitando a bandeira capturada. A felicidade é tanta, que nem parece que ele roubou algo dos outros. Parece mais que a pessoa recuperou algo que já era seu. Algo que era nosso!  E pra dizer a verdade, nada garante que esse não possa ser um modo de entender o jogo, capturar a bandeira, pode ser resgatar a bandeira. Porque não?
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Pois bem, se você veio comigo nessa imagem, então vai entender bem o que eu quero dizer com "precisamos capturar aquela bandeira verde e amarela. Que já é nossa! É nossa e está presa, capturada no campo do adversário, aprisionada no universo limitado e mesquinho da violência. Mofando entre cheiro de pólvora e fumaça de óleo diesel, mergulhada em lágrimas de miliciano e sangue de estudante favelado. Quando poderia estar tremulando de prazer, orgulho e amor próprio na mão de brasileiros maravilhosos dos que já viveram como Airton Senna, Sócrates e Abdias Nascimento, dos que ainda vivem como Daniela Mercury, Iza e Anitta. E dos que são brasileiros pela honra como Lewis Hamilton...
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Calma lá! não pense que sou ufanista ou que, ingênuo, cai no conto do vigário positivista da aristocracia brazuca que se infiltrou desde a monarquia, até a república militar, cozinhada sem tempero pelo trabalhismo reformista, e refogada sem sal pela ditadura de 64, brindada com um tira-gosto da anistia geral e irrestrita. Eu sei de onde veio essa bandeira verde e amarela,  meus senhores. E não fiquei sabendo disso por causa  das denúncias de instagram que os algoritmos me entregaram... Minha desconfiança dessa bandeira é por causa da vida de Lima Barreto. Mas, a vontade de tê-la do nosso lado é por causa de Luiz Gama. O jurista abolicionista e republicano que falou contra eles, na língua deles. É tudo nosso! Tudo nosso! O Brasil é nosso. A bandeira do Brasil é Nossa!

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Fôdace pra lá Orleans e Bragança; essa bandeira agora é nossa! Pau dela no fiofó do positivismo deles. Essa bandeira é a bandeira desenhada com lantejoulas no manto do caboclo de lança pernambucano. É a bandeira pintada no chão da favela do Rio de Janeiro. É aquela que meu tio pintou na escadaria por conta da Copa de 70.. e eu, como nasci depois passei 20 anos sem ver uma vitória. É a bandeira de vocês, que vinte anos atrás não viram ou não lembram mais da vitória de Lula, quando ele entrou no nosso campo carregando a bandeira! Depois de tanto tempo tentando avançar e sendo paralisado. Detido, por debates editados no Jornal Nacional e por um plano que, de real, só tinha o nome...

 
Em 2002, quando o nosso lado resgatou a bandeira  e trouxe ela para o nosso campo. Que alegria! ..

Assim como foi em 2002. Assim precisamos fazer hoje, vinte anos depois. Reconquistar a bandeira. E dizer bem alto na cara dessa gente embranquecida, e desengonçada, fedendo a mofo e pólvora, abraçadas com muros, louvando pneus e trocando murros entre eles mesmos: Perdeu, Playboy!
Essa bandeira é nossa. É tudo nosso!