O Livro "Dez passos para alcançar os seus sonhos" de Adriana Maria Queiroz, que trás o relato autobiográfico da filha de um casal de sertanejos baianos, nascida no interior de São Paulo, na cidade de Tupã. Jovem de origem pobre, que trabalhou como faxineira para poder pagar a faculdade, e após luta árdua e incansável chegou à Magistratura por Concurso público no Tribunal de Justiça de Goiás.
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De certo ponto de vista, o livro todo é em si, um depoimento de fé. Como se diz nas igrejas e nos tribunais : um testemunho sólido. Para mim, que não sou um religioso muito convicto (estou mais para um cético, que ainda deposita alguma fé nos limites da ciência moderna), o livro trás alguns ruídos que dificultam minha identificação com a heroína. Não é exatamente um discurso que me representa. Mas, não precisa me representar para ser bom e importante.
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Não é sobre mim, mas pode ser para mim. Porque é um discurso forte, impressionante que representa milhares, talvez milhões de mulheres negras, pobres e persistentes, que constituem de uma maneira inseparável o tecido social que liga toda a nossa sociedade. É um discurso que representa muitas mulheres que atravessam as nossas vidas todos os dias. Como sua mãe, sua irmã, sua amiga, a telefonista do seu emprego, a sua supervisora, a sua assistente ou a colega de equipe. A cliente pra quem você tentou vender um cartão de crédito ou um carro... ou mesmo a juíza que vai julgar o seu caso...
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O livro da Juíza Adriana, na opinião deste leitor, pode ser visto como um testemunho religioso. Mas, também pode funcionar como uma mensagem saída do rapper mais combativo. É um livro com tom de auto-ajuda, mas também é uma carta honesta, do tipo "Sobrevivendo no inferno" de Racionais MC. Um auto elogio fundamentado na realidade de vencedora, no estilo Emicida cantando "Toma!" ou "Zica"... Um discurso preparado para a batalha do tipo "Levanta e Anda!"...
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Eu não poderia deixar de observar outro aspecto do livro que abre uma lacuna entre esse testemunho e minhas crenças ou minhas opções discursivas... Em nenhum momento, ou melhor, em raríssimos momentos, como se não precisasse dizer o óbvio, o texto faz referência à negritude da autobiografada; o racismo é colocado como uma das muitas barreiras sociais e materiais que a heroína deve atravessar. O machismo também não é nomeado. Nem mesmo para negá-los ou localizá-lo como evento isolado...
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Eu posso sentir falta desses conceitos, Mas, certamente posso supor que uma mulher, filha de nordestinos, pobre e negra no Brasil, sabe muito bem quem é e de onde veio. E o que o texto da Juíza Adriana Queiroz parece querer enfatizar é: para onde podemos ir e como devemos agir para chegar lá. É antes de tudo um apelo para que a pessoa procure agir. Agir por palavras e pensamentos.
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Essa suposição se mostra uma convicção tranquila, quando cinco anos depois de publicado o Livro, ela atua como Coordenadora do Comitê de Igualdade Racial do Tribunal de Justiça, procurando monitorar e propor Políticas de eliminação do racismo institucional e de promoção de equidade racial. Agindo como uma das responsáveis pela implementação de cotas raciais nos concursos de servidores e magistrados.
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Ao escutar, no livro, o depoimento coerente da autora, posso não me identificar com todas as suas verdades, mas inspirado pelo seu testemunho honesto e pelo seu exemplo de vida, posso dizer que ela está coberta de razão. De razão e de ação.
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QUEIROZ, Adriana M. (2017). Dez passos para alcançar seus sonhos. Barueri: Novo Século.
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